[Avô] e outros pensamentos

Conheço as gémeas desde que sou pessoa e as tive como colegas de turma. Elas eram as gémeas: apesar de desde sempre eu conseguir distinguir a H. da R. Ainda assim, por mais anos que passem, elas serão sempre as gémeas para todos, e também para mim, serão sempre as Porto. Conheço-as desde que me mudei para Viseu e comecei a ter sonhos, medos: a ser gente. Sempre partilhámos histórias, viagens, segredos, confidências e até amigos- temos uma data de amigos em comum. Reunimo-nos sempre que eu vou a Portugal, mandam-me beijinhos de boa noite pelo facebook, fazemos video-chamadas pelo skype. Mas mais do que isso-além da amizade das coisas boas, sabemos partilhar o que de pior a vida nos traz. E por isso, apesar de não estar em Portugal, consegui sentir a dor da R. ao telefone e senti como dor minha essa perda do avô M. O avô das g. faleceu esta semana e eu não consegui estar lá. O sr. M. é aquele avô que toda a gente quer ter: o que vai buscar ao colégio, que se importa, que está presente, e que tem sempre uma história para contar. As histórias, podem não voltar a ser contadas por ele numa mesa da cozinha enquanto nos rimos" com o número de copos de vinho do Porto", mas as memórias cá ficam-porque por mais tempo que passe, são nossas. São património. E depois disto, só posso dizer que continuo aqui- apesar dos kms. Dizer que às 4 da tarde desejei muito estar aí e dar aquele abraço, porque por muito que estejamos preparados, nunca o estamos quando se trata de nós, dos nossos.

Tenho às vezes sentido o chocar dos teus ossos 
E o vento da tua asa os meus lábios roçar; 
Mas da tua presença o rasto de destroços 
Nunca de susto fez meu coração parar. 

Nunca, espanto ou receio, ao meu ânimo trouxe 
Esse aspecto de horror com que tudo apavoras, 
Nas tuas mãos erguendo a inexorável Fouce 
E a ampulheta em que vais pulverizando as horas.